segunda-feira, 24 de junho de 2013

Dia 9 do Silêncio (Cartas para Julie)

"Nem ao menos sei de onde devo partir. Há tantas fissuras que deixei pra trás, tantas coisas que deveriam ter sido ditas, questionadas, acrescentadas. Como perfeito covarde que sou, temi a tua postura diante daquilo que me tira o sono progressivamente. Segui o caminho que me pareceu mais conveniente no momento. Mas certas coisas são auto esclarecedoras, pelo próprio tempo. Coisas que me fogem do controle. E o que não pode ser explicado sem a minha interferência, permanece em meu tempo. Me cobra a cada fôlego, palavras que não sei dizer. Não sei como dizer. Esta é a principal razão pela qual lhe escrevo. Talvez, se minha atenção não estiver focada nos teus olhos, eu consiga desatar o nó da garganta.
Por tantas vezes anotei o que deverias saber, por tantas vezes guardei cada palavra ensaiada... Palavras que hão de atuar em meu lugar agora.

Não, não me sinto normal. Sinto como se todo aquele tempo em que passei me lamentando, toda a minha paciência, toda a insuficiência, tudo aquilo que abri mão, todo o tempo que esperei, tudo o que eu senti, de fato valesse algo agora. O curioso, é que o receio cresce. Receio? Medo. Medo de que a minha insuficiência, seja suficiente para que tudo finde-se por aqui. Medo de que seja só um susto. Medo de que só estejas embaralhando o que de fato sente por mim, com o que pensa que deve sentir. Medo de ser incapaz de controlar minhas próprias expectativas. Medo da sua ausência. Medo de ser incapaz de completá-la, Julie. Medo de que tudo aquilo volte, o que eu sentia. Que volte e me devaste, me governe. Estou fazendo o que posso para impedir, mas está voltando aos poucos. Juntamente ao meu pânico. Não me compreenda erroneamente, não voltaria atrás para mudar nada (a não ser tais palavras). E nem desejo recuar. Este é o ponto: permanecemos inertes. Compreensível, mas restrito. Cômodo. Monótono? Não. Peço que não encare as demais idéias como algo a ser obrigatoriamente seguido, mas como um diálogo (algo que não consigo sustentar, você bem sabe).

Se bem que tanta coisa habita no silêncio... Tanto pensamento mal formulado, tanta angústia engasgada. Tantos gritos calados. Tanta cumplicidade, tanto afeto. O silêncio nos desorienta, astuto. A linha de raciocínio quebra-se tão facilmente, não sei se por culpa tua ou minha. Sei que o futuro me amedronta. Já lhe contei que sofro de nictofobia? Logo conclui-se: temo tudo aquilo que permanece fora do meu controle. Seguir a vida de olhos fechados, é o que procuro evitar. Mesmo sendo necessário. Com alguns tropeços e joelhos ralados, aprende-se a caminhar. E sem caminhar não se recua, mas também não se evolui. Inércia.

Sei que as tuas expectativas em relação ao que mantemos são distintas, bem sei. E quem sabe, nossos objetivos sigam direções opostas. Talvez nunca se encontrem. Talvez eu não lhe baste. Talvez a caminhada lhe seja extensa demais. Mas só talvez, não seja preciso movimentar agora. É tempo para o repouso. Nosso repouso."


Allan.